Entre 2000 e 2006 frequentei ativamente a região de Lake Tahoe, na California, durante o inverno, para trabalhar nas estações de ski e viver o snowboard, a vida na neve.
São anos memoráveis e eternos na minha mente. Ali aprendi a conviver com o frio intenso. Certa vez, fui chamado por um grupo de amigos americanos para fazer uma trilha. Detalhe, seria noturna e em noite de lua cheia (a neve brilha com a luz da lua!). Topei na hora lógico! Pois bem. Foi um dos dias em que eu mais passei frio na vida, caminando sobre a neve, por horas a fio. Fiquei com o rosto todo queimado da baixa temperatura, e pedi 2 dias de licença no trabalho para me recuperar.
Esta noite na Patagônia conseguiu superar aquele trauma de quase 18 anos atrás.
Continuando o post anterior (leia aqui) fui dormir as 23h, com despertador marcado para as 3. Não adiantou nada. A ansiedade de conseguir clicar a Via Láctea com o Fitz Roy ao fundo era muito grande e eu praticamente não dormi, acordando de hora em hora pra checar o tempo na janela, se as estrelas ainda estavam por ali.
Às 3 da matina finalmente tocou o relógio e vamos nessa. Já acordei cansado. Vesti as intermináveis camadas de roupa, e saí pro carro. Já foi um choque de realidade o frio que estava fazendo, e, dessa vez, com uma novidade: Uma leve brisa gelada, cortante, que agrava ainda mais a situação. O carro estava coberto por gelo, e um termômetro esquecido dentro dele indicava -5ºC.
Novamente dirigi para a estrada, longe da cidade, afim de enquadrar o arco da Via Láctea com El Chaltén e o Monte Fitz Roy. Usando o aplicativo PhotoPills você consegue prever estas “coincidências” e planejar as suas fotos, por isso essa imagem já estava pronta na minha cabeça há pelo menos 6 meses quando eu decidi que viria para cá. Só faltava clicar…
A noite estava deslumbrante. Límpida, sem uma chance de nuvem. As estrelas saltavam aos olhos. A Via Láctea com o seu grande “sorriso” já estava no alto do céu, acima da minha cabeça. Um silêncio avassalador quando eu desliguei o carro. Neste tipo de clima não tem sapo, não tem grilo, não coruja, não tem nada que faça um som noturno, portanto qualquer barulhinho eu ja apontava a lanterna freneticamente – vamos lembrar que a região é repleta de pumas né. Comecei a fazer as fotos calmamente e gravar os video-aulas para o canal no Youtube. A medida que o tempo passava, a Via Láctea ia se movimentando para onde eu queria, ou seja, possível de ser enquadrada com as montanhas, mas o frio também apertava. Aproveitei também para executar algumas de longa exposição, na técnica que chamamos de Star Trails.
A certo ponto, por volta das 5:30AM, auge da madrugada, eu estava fazendo uma panorâmica (colagem de fotos) com 11 fotos verticais, para pegar todo o arco da Via Láctea. Cada foto tinha 20 segundos de exposição, mais o tempo de girar a cabeça do tripé levemente para o lado, para enquadrar a foto seguinte. Eu simplesmente não conseguia esperar esses 20 segundos do lado de fora do carro. Posicionava o tripé, acionava o disparador , e corria para o carro para me esquentar. Contava 20 segundos, saia de novo, ligava a lanterna, dava uma varrida geral nas estepes, (pra ver se não brilhava nenhum olho de gato) reposicionava a câmera, clicava novamente, voltava pro carro, esquenta aos mãos e pés, conta 20 segundos, tudo de novo. O frio travava meus dedos das mãos, minha mandíbula e os pés. Infernal fotografar assim, mas como eu já disse em outros videos meus, vício é vício. Eu estava conseguindo a imagem que queria, da forma que queria, na viagem que queria. Faria qualquer coisa por ela.
Nesse ritmo eu fui fotografando até por volta das 7:30AM, quando finalmente a blue hour começøu a acontecer e clarear o dia, e de uma forma súbita a Via Láctea se despediu de mim, sumindo no céu. Ainda consegui fazer mais uma panorâmica, com o dia quase claro e ela sumindo aos poucos. Lindo demais.Com o dia amanhecendo, comecei a gravar um novo video, que você confere no próximo post!